Vivi Machado
Prosa-quase-poética, às vezes.
quarta-feira, 1 de outubro de 2014
Atleta fajuta
Caminhei até quase botar os bofes pra fora. Falei com algumas pessoas para conferir meu senso de direção. Foram todos muito gentis. A certo ponto, quando já pensava em retornar, achei melhor dar uma parada e pensar um pouco na vida. Nada melhor do que um expresso com pão de queijo pra isto. Perguntei a um homem, que estava na esquina, onde teria uma cafeteria. Ele prontamente estendeu seu braço nu me apontando uma galeria e disse: entra ali que vais achar logo uma cafeteria, diz que foi o cabeludo que te mandou. Agradeci, entrei na cafeteria, pedi o café e o pão de queijo e disse quem havia me mandado. O atendente riu e disse: pois não, a senhora fique a vontade que já lhe levo na mesa.
Tomei o café e saboreava o pão de queijo, quando fui interrompida por uma candidata que logo descobriu que não sou eleitora deste estado. Mesmo assim, meio constrangida, insistiu em anotar seu nome em meu caderno de anotações, que já estava sobre a mesa. Agi com naturalidade para não constrange-la, e me dei conta do quanto esta mudança resultará na criação de novas rotinas, de novos desafios, novos encontros e principalmente de muita resistência física, porque ao relaxar, sentada lá no café, senti como se quisesse abraçar o mundo, como se o lugar sendo pequeno fosse fácil eu sair por aí a pé. Não é bem assim. Mesmo para as caminhadas exige uma estratégia e muito preparo físico para que eu não me veja exausta, longe de casa, meio desolador isto.
Navegar é preciso, mas há que se garantir um salva-vidas.
segunda-feira, 29 de setembro de 2014
Mudança de lugar
Mudei e fim. Vim pra Floripa morar de aluguel, vim para ver o mundo com outros olhos e descobrir novas palavras para escreve-lo. Busco novas experiências mundanas, leves, sem cobiças ou necessidades de autoafirmações. Não almejo ser uma grande escritora e muito menos fama, já passei da hora disto, quero a escrita pelo prazer de me envolver com as palavras para expressar o que vejo e o que sinto.
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
O colar de minha tia
sábado, 15 de fevereiro de 2014
Afinação
terça-feira, 18 de junho de 2013
Digo
quinta-feira, 11 de abril de 2013
Política e Religião
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Redenção
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Feito pelo não feito
domingo, 24 de junho de 2012
Primeira paixonite
quinta-feira, 21 de junho de 2012
O trampolim
quarta-feira, 20 de junho de 2012
O tempo da delicadeza
segunda-feira, 18 de junho de 2012
Garoa fria
domingo, 17 de junho de 2012
Vamos retomar a escrita?
terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
Eu preciso de mais tempo pra pensar
Como disse, tento levar uma vida normal. Faço minhas obrigações de trabalhadora e cidadã, dona de casa e consumidora. Preciso ir às compras por mais que prolongue esta iniciativa. Odeio fazer compras. E não é por não gostar de gastar dinheiro não. É porque não tenho sido bem atendida no comércio e na prestação de serviços. É uma miscelânea de imperícia e estupidez que me dá vontade de fundar uma comunidade no interior dos cafundós e passar a não depender de nada que seja industrializado, informatizado, comunicado, em rede, em fashion, esquimbau.
As coisas são apresentadas para mim com uma má vontade quando solicito, a qualidade é péssima, os preços são exorbitantes porque não há nenhum critério lógico de tabela, a pressa no atendimento, ah a pressa no atendimento é o pior de tudo. Não disse ainda que das seqüelas neurológicas que carrego a mais incômoda é a síndrome do pânico. É uma loucura. Isto tem me afastado das pessoas e começo a me convencer que a reclusão é quase uma necessidade de sobrevivência.
Todo este depoimento foi motivado pelo episódio de hoje. Saí de casa depois de uma semana e fui ao supermercado. Correu tudo quase bem, mesmo tendo que lidar com uma atendente que pesava as frutas reclamando que estava na sua hora do café, sem me olhar e conversando com a colega do lado. Isto é muito comum hoje no comércio local. Você pode chegar toda alegrinha para o atendimento, mas a pessoa nem te olha.
Bem, vencido o momento do super inventei de ir comprar peixe numa peixaria próxima dali, numa rua paralela. Era perto, eu poderia agüentar mais um pouco antes de voltar pra casa. Estava tudo indo bem. Eu compraria o mesmo peixe que havia comprado semanas antes para fazer o almoço para minha tia e prima. Ficara bem gostoso e eu estava precisando me alimentar melhor. Já fazia dias que tentava terminar o grão de bico feito no sábado. Entrei na peixaria e fui logo pedindo o mesmo peixe. Não tinha. Isto já me desestruturou. Então a dona, uma mulher baixa e magra, com olheiras profundas veio me atender. Eu perguntara então pelo camarão. Só tinha o da lagoa. Este eu não como. Rejeitei e já atônita porque não sei comprar peixe e não saberia decidir rápido, já que as pessoas começavam a chegar ao recinto e parecendo certas do que queriam levar. Eu pedi então que ela sugerisse outro peixe. Já meio contrariada, ela mostrou-me outro, que achei muito escuro e deduzi que seria muito forte para mim. Perguntei pelo côngruo rosa e ela me mostrou um filé muito fininho. Eu fiquei indecisa, levei o dedo indicador na vertical tapando a boca pensando se levava ou não. A mulher guardou o peixe e me disse sem demora que eu poderia ir numa peixaria mais adiante que lá talvez eu encontrasse o que queria. Fiquei em choque. Custei a cair na real. Percebi que ela estava irritada com minha indecisão e só consegui dizer com calma e meio sem graça: a senhora está me correndo, tudo bem. Eu vou embora. Nesta última frase vi minha voz sumindo e me dirigindo para a porta de saída, pensei em correr pra casa, mas resolvi tentar na outra peixaria. Cheguei lá meio amortecida, meio em estado de choque, minha voz nem saía da boca. Perguntei ao homem bonachão ali sentado que peixe ele teria para fazer ensopado. Ele logo me sugeriu 3, mas com uma serenidade tamanha que se não tivesse um peixe que me agradasse eu teria levado o homem pra casa. Ou pelo menos teria tentado.
Depois de atendida e enquanto pagava pelo peixe que levei, contei a ele com as mesmas palavras que narro aqui e ele, na sua serenidade, me disse: azar dela, aqui a senhora será sempre bem-vinda, pode levar o tempo que precisar pra decidir. Eu ainda tremia. Fiquei surpresa com minha fragilidade diante da estupidez da mulher. Com certeza nunca mais voltarei naquela peixaria. Não vou me expor a estes lugares onde a pressa comanda as relações humanas.
Não creio que eu tenha que me sentir culpada por estar indecisa na escolha de alguma coisa. Não vou levar pra casa uma coisa que vá detestar porque o mundo resolveu me forçar a engolir goela abaixo sem pensar nos meus interesses, sem procurar saber o que é melhor pra mim. Não vou ser regulada pelo tempo do mundo. Preciso de mais tempo pra pensar.
Talvez eu tenha que me fortalecer pra revidar a este tipo de ignorância com palavras mais duras e não deixar que pessoas sem noção como estas me ameacem. Mas isto não é o mais importante porque consegui chegar a casa bem, elaborei a situação e preparei o peixe na fineza. Mas antes, pensei bem como iria prepará-lo. Deixei ali no tempero por uma hora, enquanto tomava um chimarrão no jardim. Passado o tempo fiz um molho no capricho e só depois coloquei o peixe. Hummm....ficou uma delícia. E como ando valorizando o meu tempo. Logo depois do almoço, fiz um chá de limão bem gostoso e saboreei com o olhar perdido no nada. Nada como perder-se no tempo e esquecer a estupidez do mundo.
domingo, 15 de janeiro de 2012
Meu irmão é um baita marceneiro
Há poucos dias atrás bateu aqui em casa um cara todo esbaforido procurando por meu irmão para pedir que construísse um barraco de madeira para ele num terreno na rua de trás. Estava meio desnorteado, aflito mesmo, dizendo que estava procurando por Marcus fazia um tempão. Com a calma que lhe é peculiar, Marcus disse ao cara, tá, tudo bem, vamos lá ver o terreno.
Marcus voltou contando que o terreno, já separado com uma cerca de arame, fora comprado entre dois amigos e repartido igualmente. O tal proprietário aflito e inquieto ficava andando de lá pra cá e querendo saber se Marcus poderia começar logo e quanto iria custar tudo. O homem relatou que não agüentava mais viver onde morava no momento e por isso precisava arranjar um teto com urgência. Queria botar sua família dentro de um barraco para depois construir a casa. Meu irmão ficou consternado com a situação do sujeito e não cobrou o preço justo, cobrou menos.
O terreno fica próximo aqui de casa. Em poucos minutos se chega lá. Marcus foi a pé todos os dias desta última semana lá construir a casa do cara. Hoje de manhã resolvi espiar a quantas andava a obra e fiquei abismada com a capacidade de meu irmão em construir uma moradia para alguém, com material barato, fazendo um verdadeiro milagre com a madeira. Ele é perfeccionista e não poupou esforços para dar uma boa aparência ao lugar. Isto me faz pensar como é difícil encontrarmos pessoas que mesmo com materiais simples consegue edificar a beleza e a utilidade. Aquele proprietário aflito do início da semana estava com o sorriso nas orelhas. Parecia uma criança admirando o seu brinquedo novo e achando que estava ajudando enquanto tropeçava nas madeiras. Resolvi sair logo dali, porque sei que meu irmão não gosta de gente andando na volta se não vai pegar no pesado. Hi, hi, hi.
Problemas de políticas públicas de moradia a parte, também me emocionou saber que mais uma família vai ter o seu próprio canto e que meu irmão participou disto com o seu saber fazer e a sua ética solidária. Este ofício maravilhoso que é a marcenaria, transformar a natureza em objeto, um teto, um aconchego para alguém deve ter quase a idade da humanidade. Isto é muito legal. Meu irmão é um baita marceneiro e usa seu ofício para fazer coisas boas e belas. Ver aqueles dois homens ali, contratante e contratado, articulando sonhos e saberes para aquela construção, alegrou demais o meu domingo, a minha existência.
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
O banho das cachorras
Ela tentava escapar, mas não resistia ao chamego que envolve tomar um banho. Não é só a água e shampu que fazem um bom banho. Tem todo aquele chamego, aquele convencimento, as carícias e as palavras macias para garantir o processo até o final. Nestas horas é bom ser cachorra, se é que alguém me entende.
Concluída a primeira, parti pra segunda cachorra. Pra quê? Quem diz que a primeira deixava. Tive que fazer um banho meia boca pra garantir a lavada completa, porque nenhuma das duas parava quieta. Eu havia esquecido que precisava tirar uma cachorra de cena pra poder iniciar com a segunda. Parece até vida real gente.
Enfim, conclui os banhos e as duas correram pelo jardim bem afrescalhadas e cúmplices do fuzuê. Eu fiquei fedendo a cachorra molhada e sem ninguém pra me dar banho. É a vida. Quem me dera ser cachorra.
Hoje a tarde vou dar o banho no Dino, o único cachorro da casa.
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
Cuidar exige sabedoria
Talvez eu não devesse cuidar tão bem dos outros. Talvez eu devesse ser mais austera, sem tantos desdobramentos de atenção, sem tantos detalhes e requintes de ofertas de cuidados. Eu viro quase uma camareira das pessoas quando me disponho a cuidar de alguém. Isto não está certo. Isto não é normal eu diria, se pensasse bem antes de me deixar levar pela compulsão de atender às necessidades de alguém. Eu até invento necessidades que as pessoas nem haviam pensado para vê-las bem. É quase como uma instalação estética cuidar de alguém para mim. Fico antevendo o que a pessoa vai precisar e preparo o ambiente para ela, me desdobro em esquemas criativos para vê-la bem instalada, aconchegada, querida e feliz.
Mas aí a pessoa se deita nas cordas e gostando de todo aquele atendimento me escraviza. Eu suporto por um tempo, mas depois vou sentindo um mal estar, uma angustia e fico prestes a estourar. Até adoeço. Meu corpo começa a me avisar que é hora de parar com o projeto e me vejo em maus lençóis para me desfazer daquela instalação que eu mesma construí para abrigar o monstro que forjei.
Eu não sei a medida do cuidado. Deveria existir um Manual do Cuidado para pessoas cuidadoras como eu. Eu nasci para cuidar dos outros. Sei disto, mas precisaria aprender a fazer isto sem chegar ao ponto de esgotamento a que me exponho sendo tão amadora.
Não tenho sabedoria para cuidar dos outros. Será que podemos aprender a fazer isto sem chegar ao esgotamento? Como pressentir a chegada de sugadores de energia? E como nos livrarmos deles quando se instalam como se fosse de direito? Como fazer isto com o menor trauma possível para ambos os lados?
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
Minha bipolaridade
Convivo com a fragilidade de minha saúde que vive me dando sustos, vivo em sobressalto e já não sei se quero tê-la ou perdê-la e confirmar meu pessimismo. Mas nos momentos seguintes deste derrotismo olho para o céu ou para um de meus cães e percebo a magnitude da vida e do grande desperdício que cometo ao deitar-me no sofá como se fosse pra sempre. Quem poderá me defender? Ninguém. Não há chapolin colorado por aqui. Sou órfã de chapolins e tenho muita preguiça de sair em busca de algum. Às vezes chego à conclusão de que não quero ser salva, tampouco quero salvar outrem. Quero o mais absoluto egoísmo, com requintes de crueldade abandonar a tudo que me aborrece e virar uma andarilha de mim mesma. Perder-me em isolamento e desistir da humanidade. Os cães são meus melhores amigos.
O que tenho ganhado dos humanos é muito menos do que já dei e não me contento mais com ninharia. Quando dizemos que alguém está carente é porque esta pessoa não tem nada e certamente sou uma pessoa carente de afeto.
Penso que a bipolaridade, metaforica no meu caso, porque não sou portadora deste mal na realidade, mas digamos que eu seja simpatizante, ela se confirma porque seu portador reconhece a realidade de sua solidão. A percepção da solidão talvez seja o pior dos sentimentos humanos, porque enquanto não percebemos o quanto estamos sozinhos a vida parece ser levada de roldão, sem que se veja tal fato. Sabemos que todos somos sós e que morreremos assim, tudo bem se não lembrarmos disto o tempo todo. Realizamos afetos, amizades, ligações de toda a ordem para não pensar nisto. Mas quando você se retrai por algum motivo relevante na vida e não consegue mais ter ligações com humanos vem à tona a relidade tão dolorosa que é saber que você é sozinho.
Mas terrível ainda é quando você não vê possibilidade de novos laços e vê o tempo passando direto para o fim de sua vida, a velhice. Lidar com a velhice passa a ser a outra opção para não pensar na solidão. Tenho feito isto. Tenho tentado lidar com meu envelhecimento com humor e sobriedade. Se puder fazer isto, mesmo com meus altos e baixos talvez aprenda alguma coisa nesta existência tão reles e cheia de erros e percalços.
O certo é que tudo o que fiz foi para tentar ser feliz e construir um aconchego de amor e amizade, de criação e alegria, que ainda são meu norte, meu guia de possibilidades por onde quer que eu vá.
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
É hora de mudar
As coisas boas não superam as ruins. O negócio é planejar a aposentadoria mesmo. Afinal, adquirimos o direito e temos o direito de mudar a nossa rotina de vida. Fazer outras coisas sem essa cobrança permanente de fazer cada vez mais.
Tenho organizado a minha vida para mudar, largar este peso do academicismo, esquecer a preocupação que este trabalho incute na mente da gente. É um sentimento de culpa por não estar fazendo tudo o que deveria para ser um aistén. Como se fosse possível existir uma legião de aisténs. Quanta bobagem.
O bom é que não estou desmotivada para a vida, estou cansada do que se tornou a universidade. Eu sei que sou uma boa professora, mas isto não basta nesta nova cultura. E acabamos por nem ser mais bons professores porque temos que fazer tudo. E afinal, não ser bom em nada.
Vou empurrar com a barriga até fazer o pedido. Vou passar um tempo sem me obrigar a nada e depois escrever. Levarei uma vida de escritora e já sei até sobre o que vou escrever. Vou contar histórias sobre vidas reais de pessoas.
Criei um blog eumoronobolaxa.blogspot.com porque vou começar pelo Bolaxa, mas depois vou sair por aí. É uma pesquisa institucional, mas continuarei depois de aposentada. Quero contar a história de vida de pessoas comuns. Estou feliz com esta possibilidade.
Acho que me realizei profissionalmente. Atingi o objetivo de quando saí do banco. Cheguei a virar até uma doutora. É mais do que planejei. Eu só queria dar aulas na universidade. Mas já trabalho desde 1975 e já é hora de me libertar da vida de trabalhadora. É hora de passar a outra fase da vida. A fase do ócio criativo.
Todas as críticas que tenho feito à universidade são por me preocupar com o futuro dela e das pessoas. São críticas de comprometimento, mas acho que os que ficarem é que terão que experimentar os seus limites.
O mais interessante é que não foi uma questão de chegar no meu limite, foi uma descoberta de que a vida pode mudar, podemos ter outras experiências e nos ver em condições diferentes, livres do condicionamento social em que fomos introduzidos desde jovens, com compromissos e horários e cobranças de produção ativa.
Aposentar significa para mim um dever cumprido, uma possibilidade de reaprender a viver de outra forma.
Por incrível que pareça a convivência com o Marcus, meu irmão, com seu tempo vivido diferente, vivendo os dias fazendo coisas devagar, no seu tempo e curtindo pequenas coisas que consegue realizar no dia, me mostram que o sentido da vida é muito mais do que grandes realizações.
Pode-se ter muito mais alegria ao fazer um bolo de chocolate e tomar um bom café sem pressa do que conseguir publicar um artigo em uma revista b1. A simplicidade é muito mais compensadora do que a luta permanente para alcançar coisas inalcansáveis. A descoberta disto é libertadora.